segunda-feira, 16 de novembro de 2009

O polvo

Numa opinião a que decidiu dar o título de “A cabeça do polvo” Mário Crespo (MC) afirma, e cito:
«Por tudo isto é inconcebível que Manuel Godinho tenha sido o cérebro do polvo que durante anos esteve infiltrado nas maiores empresas do Estado. Ele nunca teria conhecimentos técnicos para o conseguir ser. Houve quem o mandasse fazer o que fez. Godinho saberá subornar com de sacos de cimento um Guarda-republicano corrupto ou disfarçar com lixo fedorento resíduos ferrosos roubados (pags 8241 e 8244 do despacho judicial). Saberá roubar fio de cobre e carris de caminho de ferro. Mas Godinho não é mais do que um executor empenhado e bem pago de uma quadrilha de altos executivos, conhecedores do sistema e das suas vulnerabilidades, que mandou nele. É preciso ir aos responsáveis pelas empresas públicas e aos ministérios que as tutelam. Nas finanças públicas, Manuel Godinho não é mais do que um Carlos Silvino da sucata. Se se deixar instalar a ideia de que ele é o centro de toda a culpa e que morto este bicho está morta esta peçonha, as faces continuarão ocultas. E a verdade também.» (realce meu)
MC aponta baterias para os altos quadros das empresas públicas e da esfera política – a culpa é toda “dos outros” - o que quanto a mim é não só insuficiente, mas praticamente irrelevante. O maior causador da corrupção que grassa no país é o cidadão anónimo, somos nós próprios, porque há muito abandonámos qualquer sentido de exigência.

O português comum não é exigente para com os responsáveis políticos e outros que ocupam cargos de grandeza similar, como os gestores de empresas públicas e afins. Se o fosse, não deixaria que um Primeiro-ministro envolvido em tantos “casos peculiares”, como tão bem designou a Carmex num post mais abaixo, voltasse a assumir responsabilidades governativas.

Por outro lado, o português comum tem horror que alguém seja exigente com aquilo que faz, a ver-se pelas sistemáticas reacções corporativistas sempre que alguém pretende alterar o status quo. Exemplo maior nos últimos tempos é a avaliação dos professores; qualquer pessoa com meio palmo de testa percebe pela actuação de Mário Nogueira que não é o modelo de avaliação que está em causa, mas simplesmente alguém querer avaliar o trabalho dos professores.

Last but not least, o português comum não é exigente com ele próprio. A sua preocupação última é que o ordenado (ou o subsídio) caia na conta bancária ao fim do mês. Preferencialmente sem muito esforço.

Enquanto uma cultura de exigência não estiver no âmago de cada um de nós esta vergonha jamais será alterada. Venham os Comissários Corrado Cattani que vierem.

[Publicado originalmente na Farmácia Central]

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